terça-feira, 12 de julho de 2011

A torre do califa

Era uma vez uns Emiratos. O Emirato cigarra cantou, cantou, anos a fio. Mandou fazer as mais sumptuosas obras em casa. Os imprevidentes investidores desaguaram por lá como cordeiros. Despejaram biliões para construir arranha céus. Os que compraram o resultado venderam-no passado um par de meses, com grande lucro. E os que compraram a esses a mesma coisa. E por aí fora, uma dança de cadeiras que normalmente só parava quando um russo rico ou um afegão fugido queria mesmo habitar num 86º andar, mal construído mas com muito glamour. Normalmente o último na cadeira já era o quarto ou quinto proprietário do imóvel, na altura em que o apartamento finalmente ficava pronto.

O problema é que quando a música parou não havia assim tantos russos ou afegãos bimbos para ficar com a última cadeira. E em 2008 o sub-prime começou a transformar os cordeiros da finança internacional em lobos... Em Dezembro de 2008 a "bolha" do imobiliário rebentou. Oficialmente. As previsões eram já nessa altura, que os preços do imobiliário desceriam 80% em 2009...

O Dubai ficou a dever biliões de dolares. Só para as obras do "Downtown Dubai" foram 20 biliões, incluindo quatro biliões para fazer o Burj Dubai, que vêem na foto que tirei há pouco quando passava de taxi na Sheik Zaeed. Há uns anos valentes que não vinha aqui ao Dubai: em 2007 o maior arranha-céus do mundo ainda não estava construído, portanto ver estes 828 metros de altura ali ao lado (altura da bolha, diria eu...) foi de facto emocionante. Se tiver tempo espero hoje ou amahã aproximar-me mais.

Mas voltando à fábula. Onde existe uma cigarra é de esperar encontrar uma formiguinha. Nesta fábula de bolhas do deserto assim foi tambem. O magnânimo Emir de Abu-Dhabi, um dos emirados irmãos do Dubai (Abu Dhabi é o irmão mais velho, o emirado "chefe"...), assumiu o papel de formiguinha. Tinha uns trocos amealhados graças ao petróleo que não esbanjou e veio a correr emprestar 10 biliões ao mano cigarra. Claro que a cigarra foi castigada: o Burj Dubai teve de mudar de nome. Ficará para todo o sempre conhecido como Burj Khalifa Bin Zayid, o nome do xeique que manda em Abu Dhabi.

Moral da história: amochemos à troika e a os cordeiros agora feitos lobos. Paguemos, paguemos. Ou então preparemo-nos para ter um Aeroporto Angela Merkel ou uma Ponte Sarkozy... Já para não falar de uma Torre Moodys ali para os lados de Belém!

segunda-feira, 11 de julho de 2011

Também queremos um Futuro Negro para os nossos filhos!

Negro de petróleo, claro está... Embora continue a suspeitar da capacidade dos estados em viverem para lá da "maldição do petróleo" (Angola sendo o pior caso, Brasil correndo sérios riscos de se deixar inflacionar até ao estouro, e até a Noruega a viver à conta sem investir em infraestruturas), a verdade é que não consigo deixar de dar o benefício da dúvida ao Emir do Qatar. Aqui decerto ninguém se revoltará... Há um equilíbrio que se nota no ar, a riqueza é tanta e distribuída por tão poucos que verdadeiramente o incentivo para fazer barulho é muito reduzido. E se alguém acorda mal disposto e decide mandar um sms de protesto? Enterram-no logo debaixo de um milhão, o potencial organizador de manifs esquece o sms e compra um iPad novo para jogar o Settlers enquanto voa de férias para o Tahiti...

Venha um futuro negro! Se vier acompanhado de um Emir benigno...

Deserto com ideias


Qatar é quente. E não tem uma gota de água em todo o seu pequeno território (uma peninsula com vista para o Bahrein, com o tamanho aí do Alentejo e fronteira com a Arábia Saudita). Deserto, deserto e mais deserto. Ontem quando cheguei era noite e a temperatura tinha descido para uns "refrescantes" 36ºC. Hoje enquanto era conduzido do meu hotel em Doha para o trabalho (que me aguardava a uns 90 Km de distância para Norte) o carro marcava 44ºC. Um dia menos mau... A humidade, no entanto, estava surpreendentemente alta, o que torna o calor ainda mais difícil. Parece-me portanto que o clima é idêntico ao que me lembro dos Emiratos Árabes Unidos, aqui perto, anos atrás quando passava a vida caído no Dubai.

Como podem ver da amostra de Doha abaixo, colhida da janela do meu quarto como já é tradição, a cidade não é enorme nem super-produzida como o Dubai. No entanto lá mais ao longe espreitam os guindastes no que aparenta ser uma emergente "city a la megalómano". A ver vamos daqui a uns anos, com o Mundial de Futebol a vir para aqui em 2022, se não se acabam com uma bolha como o Dubai.

Por enquanto tudo vai bem nas terras de Sua Majestade o Emir Bom, Hamad bin Khalifa, sentado em cima de reservas de petróleo capazes de manter o Qatar por bastante mais tempo como o país do mundo com o maior PIB per capita (parece que durarão pelo menos mais 37 anos...). Claro que se divide o PIB pelos cerca de 200,000 qataris, numa população de 3 ou 4 milhões se incluirmos todos os estrangeiros que trabalham no petróleo, construção, refinarias, etc...

sábado, 9 de julho de 2011

O meu limão

Sentimentos de posse e de desenraizamento juntam-se para fazer deste limão algo muito especial. Não é o da esquerda, mais enfezado, é o maior. Este grande limão em projecto já se faz notar há algum tempo. E eu gosto muito dele. Gosto porque é de facto meu: o limoeiro foi por mim plantado, na minha terra, não deu nada o ano passado e este ano traz-me esta prenda. Vejo-o crescer desde que surpreendentemente percebi que existia, umas semanas atrás. Pensava que era mais uma folha daquele limoeiro ainda pequenino, aí com metro e meio de altura, mas aquela textura rugosa começou a saltar demasiado à vista e um dia aproximei-me. Era o meu limão, verdadeiramente meu, crescendo exuberantemente ali mesmo debaixo do meu nariz. E fez-me olhar com mais atrenção para as outras cinco árvores irmãs: laranjas, mandarinas, toranjas, todas aquelas árvorezinhas enfezadas que plantei o ano passado preparam-se agora para me presentearem com os seus frutos dourados. Ainda apenas se vêem bolinhas verdes, em alguns casos bem pequeninas, mas elas vêm aí! Claro que nenhuma tão grande como o meu limão, mas já transbordam de promessas de sumos ao pequeno almoço...

Para além do sentimento de posse (este fruto é muito mais meu do que algum electrodoméstico, carro, jantar, prato ou televisão alguma vez será...), o meu limão também me ajuda a sentir que ainda tenho lastro, âncora. Que para além das pessoas que amo há algo físico e enraizado que ainda me prende a esta terra.