terça-feira, 25 de agosto de 2009

Valparaíso dos funiculares, vítima do Panamá

Condenado a disparar a câmera através de um vidro encharcado, com a falta de luz a provocar fotos desfocadas ao mínimo movimento (e, como sempre, normalmente disparo em movimento...), assim viajei de carro, sorumbático, de Santiago do Chile para Valparaíso. Foram pouco mais de 100 Km dirigindo-me para Oeste através da cordilheira que as separa, até chegar de novo (nos últimos tempos aconteceu-me bastante) às águas do Pacífico. Apesar desta outra barreira também apresentar picos nevados, não chega aos calcanhares dos Andes, que do lado oposto ladeiam o vale onde se aninha Santiago. Durante a viagem nem sequer se dá muito por se atravessar terreno montanhoso.

À medida que nos chegamos a Valparaíso os vinhedos multiplicam-se. Deve ser lindo, mas através da chuva não dá para notar... Deu no entanto para ver o cuidado com que as propriedades promovem a cultura do vinho, com as casas principais das quintas com grandes letreiros anunciando uma preparação para o turismo que a nós ainda nos falta, nesta vertente vinícola. Este turismo baseado no vinho já eu vi bem desenvolvido há mais de 15 anos na África do Sul dos últimos anos de apartheid, na região de Paarl perto do Cabo, mas em Portugal tenho ideia (também não ando muito por cá...) que não se aproveita o tema à mesma escala.

Em Valparaíso mais do mesmo: chuva, com a agravante de me ter deslocado muito a pé depois de largarmos o carro num parque subterrâneo. Valparaíso deve ter o seu quê, com as suas casas de madeira coloridas alcandoradas na falésia, com a primeira linha com vista para o Pacífico ocupada pelas mais luxuosas, numa das quais o famoso poeta Pablo Neruda morou. Pouco se nota já das riquezas passadas, quando Valparaíso era um dos principais portos da costa Oeste das Américas, paragem obrigatória para os navios que ligavam o rico Leste Norte-Americano ao Oeste do continente. Em 1914 o canal do Panamá mudou tudo, e só agora, captando navios de cruzeiro, Valparaíso tenta recuperar algo do seu brilho de outrora.

A costa do Pacífico nesta zona está entalada entre a cordilheira e o mar, sem apresentar sequer grande plataforma continental (logo ao primeiro passo deve perder-se o pé e dois metros à frente devemos ter um abismo aquático). Não é portanto de estranhar que a Valparaíso original, mais antiga, pareça "pendurada" nas alturas, enquanto que a zona mais moderna do centro se espraia em terrenos conquistados ao mar. Não tive tempo para explorar essa área, considerada Património da Humanidade, mas ainda deu para apanhar um dos ex-libris da cidade: um funicular (há vários), cujo ar vetusto não era só uma patine chic: a coisa estava mesmo com ar decrépito e dei-me feliz por subir e descer a salvo! Já agora, vi de novo em Valparaíso algo que não via desde a juventude, uma espécie que penso estar extinta em Portugal: trolleys, iguaizinhos aos do Porto de h+a muitos anos. Destes já não há mais...

Para que não seja só chuva e sombras desfocadas, deixo-vos o único sorriso dessa tristonha passagem por Valparaíso, captado de raspão como sempre.

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